domingo, 10 de abril de 2011

Alunos universitários, eventos e desinteresse formativo


Organizar um evento hoje em dia nas universidades tem sido cada vez mais desmotivador. Primeiro porque com o corte de verbas federais, estaduais e municipais, se o evento não estiver diretamente vinculado a uma pós-graduação sua única fonte de financiamento irá emanar das taxas de inscrição cobradas aos participantes.

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O problema é que boa parte da nova geração de alunos de universidades públicas acredita que todo e qualquer evento deve ser gratuito, trazer palestrantes renomados de outro Estado, fornecer certificado e coffee break, além de material (pastas de alta qualidade, livros, etc.), como se tudo isso pudesse ser feito sem custos. Alegam não possuir os referidos valores para pagamento da inscrição, mesmo quando essa está entre R$20,00 e R$30,00, todavia, gastam muito mais que isso em recargas semanais de celulares ou idas a salões de cabeleireiros.

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Cada vez o que se observa é um desinteresse dos alunos universitários em sua própria formação. A universidade é só um local para "pegar um diploma" e depois estes mesmos quando amargarem a falta de competência ou qualificação extra-diploma em seus currículos irão culpabilizar a universidade ou o curso de graduação que fizeram, esquecendo-se dos eventos que deixaram de freqüentar, das leituras, anotações e etc.

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A preocupação excessiva com carga horária, quando deviam preocupar-se em participar do maior número de eventos para terem um curriculo lattes/CNPq apresentável e poderem concorrer á bolsas e ingresso em Mestrados e Doutorados. Não produzem e querem que tipo de oportunidades?

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Outra coisa que me chama muito a atenção é a postura dos alunos que se inscrevem nos eventos: primeiro, eles querem um certificado com uma carga horária de 40h em diante, todavia não têm disponibilidade para participar de todas as atividades de um evento que ocorra manhã, tarde e noite e mesmo assim querem receber tal certificação. Segundo, eles comparecem as palestras e não anotam absolutamente nada que o palestrante esteja falando. Terceiro, eles não aproveitam o momento para fazer perguntas, tirar dúvidas extra-sala de aula. Quarto, eles chegam atrasados, saem mais cedo ou faltam vários dias.

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Que tipo de profissional realmente alguém espera ser no mercado de trabalho ao adotar uma postura dessa? A universidade oferece os instrumentais para a formação do aluno, mas o interesse, o compromisso, a dedicação e o envolvimento deve ser dele. Se ele mesmo não está interessado em sua formação então porque ocupar uma vaga em uma universidade federal? Porque não ficar em casa vendo TV e comendo ruffles? Quem sabe aquela vaga poderia ser ocupada por um "aluno de verdade", disposto a aprender e a se tornar um profissional de qualidade para aqueles que muitas vezes jamais irão freqüentar as salas de uma universidade por falta de oportunidade.

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Se todos os alunos de universidades federais tivessem a consciência de que seus estudos não são gratuitos, mas sim financiados pelos impostos de toda a população brasileira (principalmente aquela que nunca foi ou irá a universidade) talvez assumissem o compromisso de um retorno social por esse investimento que é realizado pelo governo. É nessas horas que o sistema de faculdades privadas no exterior (mesmo as públicas são pagas, haja vista: Sorbonne, Havard, Oxford, dentre outras) funciona, pois parece que quando se paga, se dá mais valor ao que se recebe.

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E pensar que esse desinteresse está em todos os cursos e que em breve poderemos ser atendidos por médicos, advogados, arquitetos, professores e tantos outros cuja formação capenga lhe possibilitou um diploma sem conhecimento, sem vivência baseado na relação: assistir aula e voltar para casa, sem participar de grupos e projetos de pesquisa, sem apresentar trabalhos em eventos, sem publicar em revistas acadêmicas. O que querem essas pessoas: enriquecer do ócio? Desejo profundamente que todos se mantenham desempregados, assim não arriscarão vidas com sua falta de qualidade. Ou então antes de sermos atendidos devemos todos pedir o currículo comprovado do indivíduo para saber que tipo de profissional é aquele e se valerá o nosso dinheiro na contratação de seus serviços.

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A universidade tem muitos problemas, mas seus alunos não são vítimas e os pais que deveriam ocupar-se de acompanhar e incentivar a produtividade de seus filhos parecem cada vez mais ausentar-se de suas responsabilidades como pais. Entregam-nos á escola e a professora para que essa além de conhecimentos lhes transmita "educação"que os mesmos não ofertam (seja pela numerosa quantidade de filhos ou horas no emprego). No final ninguém se compromete com nada, a qualidade é a pior possível em todos os setores e as pessoas ainda têm a cara de pau de reclamar do Brasil.

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Colegas, nós somos esse Brasil! Está na hora de acordar!

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Patrimônio egípcio em perigo!


Com os recentes conflitos entre a população civil clamando por democracia (após a derrubada da ditadura na Tunísia) e a firme ditadura que mantêm Hosni Mubarak no governo do Egito há 30 anos, viu-se em reportagens televisivas durante a semana as ações de vandalismo e saques em vários museus e dentre eles o Museu do Cairo, inaugurado em 1863, localizado no centro da cidade, na praça Tahrir.
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Com aproximadamente 12.000 peças em exposição que compreendem todo o período histórico egípcio estima-se que mais 150.000 artefatos ainda estejam por serem descobertos pelas escavações arqueológicas nas cavernas e possivelmente transferidos à reserva técnica dos museus locais.
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Durante os atos de vandalismo várias peças foram roubadas ou destruídas, expositores tiveram seus vidros quebrados e duas múmias do túmulo de Tutankhamon foram danificadas. O prejuízo só não foi maior, pois em um ato de consciência patrimonial valoroso os manifestantes contra a presidência se reuniram em uma grande corrente, de braços dados em frente ao museu para impedir que este fosse invadido, uma vez que a força policial só chegou ao local horas depois. Mesmo assim os vândalos conseguiram entrar pelo telhado da instituição.
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No dia 2 de fevereiro, novamente o museu se viu sob risco, tendo parte de uma parede lateral incendiada com o lançamento de coqueteis molotv durante o confronto na praça Tahrir.
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Tais fatos colocam em risco o pleito que Egito e Grécia têm feito à UNESCO para que as peças que lhes foram saqueadas durante a viagens ultramarinas da potências européias e mais tarde com o imperialismo do século XIX, e hoje estão expostas no Museu do Louvre (Paris) e no Museu Britânico (Londres), sejam devolvidas às suas regiões de origem. A grande argumentação dos governos da França e da Inglaterra para a manutenção da "guarda" dessas peças tem sido o fato das mesmas serem consideradas "patrimônio da humanidade" e serem os países europeus detentores de melhores condições para a salvaguarda desse tesouro da antigüidade (financeiras, segurança e acesso ao público estrangeiro).
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Espera-se que a situação política no Egito encontre sua resolução, que a democracia triunfe e que seu patrimônio cultural que é de todos nós também residentes no ocidente, seja conservado, preservado e divulgado. A história agradece!

A universidade e as "panelinhas políticas": reflexões contemporâneas


Há algum tempo minhas ideologias à respeito da universidade como pólo de posicionamento crítico e conscientizador dos direitos de cidadania se esvaíram. Na arena das ciências humanas e sociais confrontam-se partidarismos publicizados neste ou naquele corredor, nesta ou naquela instituição de ensino superior pública ou privada onde sempre há os defensores viscerais de marxismos, trotskismos ou seus antagônicos capitalismo e neoliberalismos. Discursos inflamados são proferidos em sala de aula (por alunos ou professores), em sindicatos, centros acadêmicos, DCE's ou quaisquer outras instâncias pseudo-representativas que não se furtam à lançar mão de teorias, jargões e/ou alguma bibliografia ás vezes consistente e outras vezes somente um copy e paste de introdução e conclusão do livro de algum renomado cientista político ou econômico que possa reforçar suas idéias. Isso sempre me causou profunda irritação, até mesmo porque salvo os rotulados "direitistas" (que em parte são mais condizentes quanto suas ações), aqueles que pregam uma fala de "esquerda" - com raríssimas exceções - são os primeiros a se corromper diante da oferta de um cargo comissionado, uma gratificação, uma exposição pública que lhes garanta status e algum poder, que nesses casos de forma alguma é "socializado com as massas". Dessa forma todo o conteúdo se esvazia e a deseperança toma conta das novas gerações que são gestadas em meio à compra de idéias distorcidas ou de uma alienação justificada pela falta de credibilidade naqueles que se propõem como lideranças.
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A universidade cada vez mais enfrenta esses dilemas e seus circuitos internos povoados de professores mestres e doutores vêem em grande parte o poder decisório concentrar-se nas mãos de ditos intelectuais sem produtividade acadêmica, que buscam ocupar postos como "delegados", representantes em "comissões", bancas ou quaisquer outros meios que lhes dê alguma projeção enquanto em seus pífios currículos lattes amargam um ostracismo de 5 ou mais anos sem qualquer publicação científica. A esses, pela incapacidade de se posicionarem como "produtivos" só restam as relações de amizade e compadrio que remontam o personalismo há muito já tratados por Sérgio Buarque de Hollanda em seu clássico Raízes do Brasil (1930).
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Imiscuídos nesses "círculos de poder" assumem coordenações de cursos de graduação, pós-graduação, pró-reitorias ou reitorias e excluem aqueles verdadeiramente "produtivos" que possam lhes ofuscar ou ao menos revelar sua inconsistência no meio universitário.
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Cada vez presenciamos mais professores universitários confinados em si mesmos, uma vez que em seus próprios departamentos ou programas de pós-graduação não são valorizados pela sua produção por seus pares, sendo excluídos e até mesmo substituídos por aqueles que conseguem ser "aprovados pela panelinha". E nesse rol encontram-se professores que "dizem" desenvolver projetos de pesquisa há mais de um ano, mas que não apresentam sequer resultados parciais de tais pesquisas em anais de eventos, que sequer enviam um texto com 1.200 caracteres para divulgação em jornais de circulação popular e muito menos publicam em periódicos acadêmicos qualis A ou B. Na verdade não publicam em lugar algum. E estes infelizmente estão se tornando a regra.
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Claro que existem exceções, mas são aqueles cada vez mais bombardeados dentro da academia como "elitistas", "produtores em massa", "alimentadores de um sistema fordista CNPq ou Capes" e por aí vai. As opções de sobrevivência para esses professores cada vez mais se restringe a:
1) Igualar-se aos "não-produtivos" para ser integrados em suas panelinhas de jogos de poder e interesse (uma vez que contam as relações interpressoais e não o perfil acadêmico de qualidade);
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2) Isolar-se e ser alijado de processos decisórios (bancas de mestrado/doutorado; comissões universitárias; bancas de concurso), seguindo solitário com sua produtividade;
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3) Enfrentar abertamente as panelinhas (já em posição desvantajosa por não possuir ele uma "panelinha quantitativa ou significativa em termos de relações políticas" para medir forças) e ser classificado como: "louco", "pavio-curto", "destemperado", "instável", dentre outras adjetivações recorrentes e sinônimas.
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Nesse sentido, em meio à um quadro de proliferação de campi universitários federais no Brasil, cada vez mais essa condição se prolifera de norte a sul do país. E cada vez mais embora a teoria seja diversa, na prática ensina-se aos alunos universitários que o sucesso profissional não depende de seu estudo e qualidade, mas sim das redes de relação e inserção nos jogos políticos da universidade.
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Para além de "esquerdistas" ou "direitistas" na academia, são as panelinhas de "privilégio" que ascendem e tomam conta dos espaços "silenciosamente", sem faixas, sem piquetes, sem algazarras, sem caras-pintadas.
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Por isso, se você é um futuro graduando ou pós-graduando e deseja conferir tais argumentos aqui expostos, verifique o currículo lattes de seus professores no site do CNPq (http://www.cnpq.br/) e compare suas ocupações de postos na academia. Certamente essa "primeira pesquisa" lhe dirá quem é quem no reino da "falsa criticidade acadêmica".
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Salve a massa ignára! Ao menos ela legitimamente não sabe o que faz...já os mestres e doutores...

terça-feira, 7 de julho de 2009

BORGES: MEMÓRIA E ESQUECIMENTO COMO EMBLEMAS DA AMÉRICA LATINA.


Jorge Luis Borges, nascido em Buenos Aires em agosto de 1899 e falecido em julho de 1986 em Genebra, foi um escritor atuante em diversas perspectivas do fazer literário, realizando seu ofício no campo da poesia, da tradução, da crítica e dos ensaios permeados por contos e histórias curtas.

O objetivo desse artigo é tratar especificamente de dois contos: Funes el memorioso e La Biblioteca de Babel, constantes de seu livro Ficções de 1944, relacionando a temática da memória e do esquecimento presente em seus escritos com os debates teóricos em torno desses dois conceitos que adquiriram impulso no Brasil no último quartel do século XX. A opção por essa análise literária, parte da predominância que os olhares sobre a Europa (em especial França e Alemanha) e a América do Norte receberam nessa abordagem, desconsiderando em certa medida produções latino americanas.

O contexto da América Latina, por sua condição primeiro de colônia dos países ibéricos e mais tarde como lócus de experiências políticas traumáticas advindas de diversas ditaduras militares que eclodem em meados do século XX, estabelece uma relação muito particular com as atividade de rememoração e esquecimento, sejam estas articuladas pelo Estado – como forma de manutenção/ imposição do poder ou indulto de anistia por seus atos – ou pela sociedade civil como forma de protesto e reivindicação cidadã.

Memória e esquecimento no debate teórico das ciências humanas.

O século XX inaugurou um período marcado pela valorização do presente compreendido como “vida” em oposição a um passado associado à “morte”. Após duas guerras mundiais se instaurou o slogan: “Tout, tout de suite” (tudo, tudo agora) inscrito nos muros de Paris em maio de 1968. A desilusão com as experiências revolucionárias concentrou a idéia do presente como principal categoria de reflexão história. O presente, nada além dele, eis o que François Hartog denomina de “presentismo” ao discutir os regimes de historicidade em suas diversas temporalidades. (HARTOG, 2003.)

O processo civilizatório da modernidade corporificado em tendências globalizantes visa homogeneizar modelos econômicos, políticos, sociais e culturais dentro dos padrões pré-estabelecidos pelos países hegemônicos no panorama mundial. As regras do ocidente estendem seus tentáculos a todos os espaços ditando modos de pensar e agir. Vive-se sob a égide do imediatismo, do “tempo real”, no qual o passado como elemento fundador ou ancestral ruiu sob o descrédito da noção de fragmentação e do esquecimento.

O que chamamos de esquecimento no sentido coletivo, aparece quando grupos humanos deixam de transmitir para a posteridade – o que aprenderam do passado , – seja voluntariamente ou passivamente, por rejeição, indiferença ou indolência, ou ainda por alguma catástrofe histórica quebrando o curso dos dias e dos acontecimentos. (YERUSHALMI, 1998).

A memória é muitas vezes definida como a capacidade de lembrar o passado. Porém, esta simples descrição contém significados distintos, assim como cada um destes significados pode ser denominado por diferentes termos. Por “memória”, nós entendemos o ato de cantarolar uma música de cor, andar de bicicleta, seguir um trajeto diário sem quedas ou ainda manter lembranças de pessoas ou fatos do passado, e aprender através deles. Estes aspectos da memória, que durante muito tempo foram analisados pela psicologia e pela filosofia a partir da capacidade individual de lembrar, têm sido associados atualmente a aspectos sócio-culturais. (FENTRESS, James; WICKHAM, Chris, 1992).


Na medida em que aspectos sociais são considerados, os conceitos de memória se diversificam: “memória social”, “atos coletivos de lembrar e esquecer”, “tradição”, “traços da memória”. Estes conceitos representam não só diferentes percepções de um mesmo acontecimento, como eles também explicam diferentes fenômenos indistintamente relacionados como memória. Na procura de definição do que seja “memória”, os conceitos explicam seu funcionamento, sua ação criadora, suas ligações com a esfera social, com o poder, com o inconsciente individual ou coletivo.

(Continua...)